arte22bra-101-carga-a7Brasília, 22 de março – Apesar da série de desonerações fiscais concedidas pelo governo no ano passado, a carga tributária em 2012 ficou praticamente estável em relação ao ano anterior, ao subir de 35,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011 para 35,4%, de acordo com cálculos realizados pela LCA Consultores, a pedido do Valor.

A Receita Federal estima que a renúncia fiscal no ano passado foi de R$ 43 bilhões, o equivalente a cerca de 1% do PIB. Para Braulio Borges, economista-chefe da LCA, essa redução não se traduziu em menor carga tributária, porque boa parte das isenções tributárias com impacto permanente para a arrecadação – caso da desoneração da folha de pagamentos, por exemplo – foi implementada apenas parcialmente no ano passado.

A substituição da contribuição previdenciária por uma alíquota sobre faturamento bruto valeu para apenas quatro setores desde o início do ano. A medida foi expandida para 40 ramos desde janeiro, e construção civil e o comércio varejista também passarão a recolher a contribuição patronal com base na receita bruta ainda neste primeiro semestre. Além disso, diz Borges, o governo também decidiu onerar produtos, como cigarros e bebidas alcoólicas. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre cigarros, por exemplo, subirá 55%, de forma escalonada, até 2015.

Ainda assim, a arrecadação de impostos e contribuições líquidas de restituições e incentivos fiscais caiu no ano passado e ficou em 14,9% do PIB, percentual inferior ao observado em 2011 (15,1%) e também à média do período pré-crise, entre 2005 e 2008, de 15,6%.

Para Borges, essa queda da arrecadação como proporção do PIB mostra, em parte, o esforço do governo em estancar o aumento da carga tributária que incide sobre o setor produtivo, embora o economista lembre que a desaceleração também ocorreu por causa do fraco crescimento nos últimos dois anos. A extinção da CPMF em 2008, que gerava, anualmente, receita de cerca de 1,5% do PIB para os cofres públicos, também foi importante nessa retração.

Para o especialista em contas públicas José Roberto Afonso, a carga tributária não cede, apesar do volume expressivo de desonerações, porque algumas medidas anunciadas têm efeito contrário ao estimado pelo governo. Roberto Afonso menciona a isenção de impostos federais para produtos da cesta básica. A medida, com renúncia fiscal estimada em R$ 5,5 bilhões apenas em 2013, pode resultar em aumento do custo por causa dos créditos tributários acumulados ao longo da cadeia.

 

Para um produtor apenas de bens da cesta básica, por exemplo, não será mais possível usar os créditos de PIS e Cofins pagos na compra dos insumos. Se o Fisco não devolver os créditos acumulados ao longo da cadeia, esse fabricante não sentirá o benefício, já que ficará mantida a carga indireta que incide sobre o produto, o que já acontece com os exportadores.

“Quando se dá muita isenção, e o Fisco não devolve os créditos acumulados, a isenção aumenta o custo, por mais paradoxal que seja”, diz Roberto Afonso. Em artigo recente, ele afirmou que, de acordo com cálculos da Receita, chega a R$ 23 bilhões o total do saldo não aproveitado de Cofins, PIS e IPI pelas empresas. Para o especialista, as desonerações são superestimadas. “Para medir de fato o resultado concreto, o governo deveria publicar a memória de cálculo e a metologia das desonerações, o que não faz hoje. O governo só estima concretamente o tamanho da renúncia a pedido do TCU. ”

Professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Margarida Gutierrez diz que a formalização do mercado de trabalho também continuou a sustentar a carga tributária em patamar elevado. Segundo cálculos da LCA, as receitas da Previdência Social sobem ininterruptamente, como proporção do PIB, desde 2003, quando representavam 4,7% do produto nacional. No ano passado, alcançaram 6,2% do PIB. É um reflexo do bom momento para o mercado de trabalho, em que os níveis de ocupação estão na máxima registrada para a série atual.

Para Margarida, o aperto da fiscalização pelo Fisco também tem papel na manutenção da carga, apesar das desonerações. No ano passado, as autuações da Receita somaram R$ 115,8 bilhões, alta nominal de 5,6% ante o montante de 2011 (R$ 109,6 bilhões).

Gabriel Barros, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), afirma que a resistência da carga tributária pode ser explicada também pela composição da arrecadação. O economista estima que o Imposto de Renda e a Previdência, responsáveis por metade da carga, dependem, em grande parte, da massa salarial, que cresceu 5,4% no ano passado.

Barros avalia que em 2013 as desonerações terão mais impacto sobre a arrecadação, e por isso não descarta que a carga tributária recue. As principais renúncias tributária com a mudança da base de cobrança da contribuição patronal e a redução a zero de impostos sobre a cesta básica, juntas, implicam cerca de R$ 20 bilhões a menos para os cofres públicos.

Para Borges, da LCA, a parcela do PIB direcionada para o Estado em 2013 pode ficar menor, ao contrário do que costuma ocorrer em anos de recuperação da atividade econômica. A LCA estima alta de 3,5% do PIB neste ano, ante expansão de apenas 0,9% em 2012.

Para Barros, no entanto, as medidas têm excessivo foco em questões pontuais e é difícil vislumbrar uma agenda de médio prazo que tenha por objetivo diminuir a complexidade do sistema tributário. Entre as agendas que podem ter resultado positivo está a unificação da alíquota interestadual do ICMS, com efeitos que serão sentidos no longo prazo.

Borges menciona também a reforma do PIS e da Cofins. “Os maiores contenciosos tributário na Justiça hoje são em torno do que gera e não gera créditos”. A ideia hoje no governo é unificar e simplificar esses dois tributos, mas a reforma só deve avançar em 2014.

Valor Econômico