Brasília, 25 de julho – » Servidores que têm entre suas atribuições alimentar o site oficial do governo com os contracheques dos funcionários públicos locais conseguem liminar na Justiça para evitar a divulgação dos próprios salários
A carreira de servidores que atuam justamente na secretaria responsável por divulgar o salário dos funcionários públicos do Distrito Federal está respaldada na Justiça para resguardar as informações sobre os próprios vencimentos. Os auditores de controle interno do DF, que somam pouco mais de 600 profissionais — entre ativos e inativos — e ganham de R$ 9 mil até o teto constitucional de R$ 24,1 mil conquistaram uma liminar que lhes permitiu retirar da internet as informações pessoais sobre quanto ganham. Entre os trabalhadores abrangidos pela medida está o responsável técnico por alimentar o site da Secretaria de Transparência (www.transparencia.df.gov.br), que divulga as remunerações alheias, mas preserva seus próprios dados.
Entre todas as categorias do funcionalismo público local, a liminar que favorece o Sindicato dos Servidores Integrantes da Carreira Auditoria de Controle Interno do DF (Sindifico) é a única em vigor. Foi concedida pelo desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) Mário Machado no último dia 9.
Em sua decisão, o magistrado sustenta que a Lei de Acesso à Informação não determina a divulgação da listagem nominal da remuneração dos servidores públicos e que, dessa forma, “a regulamentação que a impõe extrapola o poder regulamentar, sendo inválida”. Para Machado, o real objetivo da lei “é assegurar o direito fundamental de acesso à informação, sem violar a intimidade e a privacidade dos servidores públicos e de seus familiares, muito menos colocar em risco sua segurança”.
O remédio jurídico da liminar — usado para antecipar uma decisão quando há prejuízo de dano irreparável — atende ao pedido do SINDIFICO, que na ação impetrada no TJDFT fala em violação aos dispositivos constitucionais. “A publicação das informações na forma da Portaria Regulamentadora, além de extrapolar a própria lei que lhe deu origem, violou dispositivos constitucionais e infraconstitucionais que protegem as pessoas, submetendo os substituídos aos riscos decorrentes da divulgação sem limites de informações que comprometem a segurança própria e familiar e expõe suas vidas privadas”.
Vitória
O presidente do sindicato dos auditores fiscais do DF, Jaran de Brito, comentou a vitória no site da entidade: “Tivemos uma grande preocupação com as consequências da divulgação de dados pessoais. Consultamos uma pessoa especialista em segurança da informação e constatamos que com a ocultação de apenas três dígitos do CPF, é possível achar, em poucos minutos, por meio de programa de computador que fará mil tentativas apenas, qual é o número correto. Com o nome e o CPF expostos, o servidores podem sofrer prejuizos pessoais.”
Jaran de Brito é funcionário da Secretaria de Transparência, onde trabalham pelo menos 100 colegas da carreira. Entre eles, o servidor lotado em uma das subsecretarias de Transparência e que lida diretamente com o site desenvolvido para abrigar os relatórios que informam os dados de contracheques dos funcionários do GDF. Jaran de Brito diz que o sindicato está sugerindo ao governo que encontre outras alternativas para “essa ação de transparência, desde que não comprometam a segurança dos servidores, especialmente os da nossa carreira”.
Chefiada por Carlos Higino, que é auditor fiscal, mas da carreira federal e portanto está com o salário — no teto constitucional — à disposição na internet, a Secretaria de Transparência tenta derrubar a liminar do Sindifico na Justiça. “Acionamos a Procuradoria do DF para reverter essa decisão. Assim como ocorreu com todos os outros sindicatos, não fiz corpo mole para defender a categoria de auditores. E acredito que a divulgação dos salários de todos os funcionários públicos é só uma questão de tempo, já que o próprio Supremo Tribunal Federal optou pela publicação dessas informações”, confia Higino.
» LILIAN TAHAN
COLABOROU ALMIRO MARCOS – Correio Braziliense/TJDFT
Funções
Além de atuar na Secretaria de Transparência, os auditores fiscais do DF também estão lotados nas pastas de Fazenda e de Planejamento e Gestão. Desenvolvem funções como a elaboração da Lei Orçamentária, a estruturação das contas do governador, auditoria nas atividades de gestão, avaliação de programas de governo e orientação dos gestores quanto à aplicação eficiente de
recursos públicos.
Memória
Enxurrada de ações
O GDF começou a publicar os contracheques nominais da maioria dos seus 190 mil servidores em 27 de junho deste ano. A medida atende a Lei de Acesso à Informação, sancionada pela presidente Dilma Rousseff no mês anterior. Com a decisão, o Distrito Federal saiu na frente das demais unidades da Federação.
A disponibilização dos dados causou interesse na população. Em poucos dias, mais de 2 milhões de pessoas acessaram o Portal da Transparência. Por outro lado, servidores e sindicatos ficaram descontentes e surgiram as primeiras ações na Justiça. Em 29 de junho, o Sindicato dos Servidores Civis do DF (Sindireta) conseguiu liminar para retirar a publicação do ar. A decisão só foi cumprida na terça-feira da semana seguinte (3 de julho), sendo que foi derrubada na mesma data. O portal ficou fora do ar por apenas uma noite.
Apesar de vários sindicatos terem ingressado com ações na Justiçacontra a publicação dos contracheques, apenas o que representa os auditores fiscais conseguiu êxito.