O Estado de S. Paulo – 08/09/2011 |
Quinze governadores apoiam a criação de um tributo para financiar a saúde – mais precisamente, a recriação do velho imposto do cheque, também conhecido como Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta em 2007. A presidente Dilma Rousseff procura ficar a distância, para evitar o custo político dessa iniciativa. Mas dificilmente recusará o presente, se governadores e parlamentares cuidarem de exumar aquele monstrengo tributário, com alíquota menor e com o nome de Contribuição Social para a Saúde (CSS) ou algo parecido. Tem-se conversado também sobre outras possibilidades. Algumas são politicamente complicadas e pelo menos uma é claramente fantasiosa neste momento.
Uma alternativa com certeza atraente para pessoas politicamente corretas seria o aumento de impostos sobre cigarros e bebidas alcoólicas. Mas para isso seria preciso enfrentar o lobby poderoso de grandes indústrias. Também se fala sobre uma possível taxação do jogo, mas o primeiro passo, não muito fácil, teria de ser no mínimo a liberação dos bingos. Finalmente, há quem proponha o uso de royalties obtidos com a exploração do pré-sal para o financiamento da saúde. Ninguém pode dizer com segurança quando estará disponível esse dinheiro nem quanto será arrecadado.
A aventura do pré-sal apenas começou e ainda falta muito tempo para se iniciar a exploração desse petróleo em escala significativa. Se o financiamento da saúde for mesmo um problema urgente, como dizem tantos políticos, não se poderá resolvê-lo com royalties do pré-sal, um recurso por enquanto só existente na imaginação. O governo e seus aliados precisam decidir: ou falam de urgência na saúde ou falam do pré-sal como solução. Não há como sustentar os dois discursos ao mesmo tempo.
Dinheiro do pré-sal, se vier, será para reforçar orçamentos da União, dos Estados e dos municípios dentro de vários anos. Se o governo e seus aliados procuram uma solução de curto prazo, terão de pensar em algo diferente. Por isso é mantido o interesse na recriação da CPMF, embora a presidente Dilma Rousseff prefira não se envolver diretamente no assunto. Do ponto de vista do contribuinte, a questão importante é outra: o governo precisa mesmo de mais dinheiro para a saúde? E vale a pena acrescentar uma segunda pergunta: se a tributação aumentar, a administração federal será melhorada?
Não pode haver dúvida quanto a esses pontos. Em primeiro lugar, o governo federal deveria abster-se de lançar novos encargos sobre o contribuinte antes de um esforço honesto e persistente para aumentar a própria competência. A administração federal arrecada muito, gasta mal, exige pouco de seus quadros e deixa muito dinheiro ir pelo ralo. Nem sequer consegue cuidar do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), essa colcha de retalhos agitada como grande símbolo da política nacional de desenvolvimento. Desde o lançamento desse programa até o ano passado, o Tesouro só pagou 60,9% dos valores previstos no orçamento. Neste ano, o PAC 2 mal começou a ser realizado, porque a maior parte dos desembolsos correspondeu à liquidação de restos a pagar. Na gestão da saúde a inépcia é igualmente espantosa. Dos R$ 5,09 bilhões previstos para investimento neste ano, o governo só pagou R$ 1,44 bilhão até o fim de agosto, segundo tabela divulgada pela organização Contas Abertas.
Seria fácil multiplicar os exemplos de gestão ineficiente. Facílimo, também, seria apontar as muitas bandalheiras praticadas com dinheiro público, a pulverização de verbas por meio de emendas parlamentares de má qualidade e o enorme desperdício perpetrado por meio de convênios. Antes de pedir mais dinheiro ao contribuinte, a presidente Dilma Rousseff deveria passar a limpo o funcionamento do próprio governo. Que tal começar com a leitura do site do Tribunal de Contas e com o exame de algum material da Controladoria-Geral da União? Lá está o repertório do que o governo não pode e não deve fazer, mas faz. A presidente prometeu mais de uma vez, logo depois de eleita e também por ocasião da posse, dar atenção especial à qualidade do gasto e aos padrões de gestão. O primeiro ano de governo é um bom momento para isso.
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