Para o professor da UnB José Luís Oreiro, processo de desindustrialização da economia prejudica crescimento de longo prazo

Metrópoles

om o avanço de apenas 1,1% no Produto Interno Bruto (PIB) – valor de todos os bens e serviços produzidos na economia – em 2019, informado nesta quarta-feira (04/03), pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o nível da atividade econômica no Brasil ainda está 3,1% abaixo do pico, antes do início da recessão de 2014 a 2016.

O professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luís Oreiro vê a recuperação ainda mais distante, já que, no fim de 2018, o nível da atividade estava “quase 20%” abaixo do patamar em que deveria estar, se a tendência de crescimento de longo prazo fosse mantida.

Nas contas da coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis, o PIB atingiu no quarto trimestre de 2019 nível equivalente ao que foi verificado no primeiro trimestre de 2013. “É o mesmo patamar do primeiro trimestre de 2013”, disse Rebeca, em entrevista coletiva na sede do IBGE.

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Na visão de Oreiro, para se recuperar completamente, a atividade econômica precisaria retomar seu curso, conforme as tendências de longo prazo, atingindo o nível em que estaria caso a recessão não tivesse ocorrido.

“As pessoas usam um conceito equivocado, de que a economia vai se recuperar quando voltar ao nível do PIB de antes da crise. Isso não é correto. Na verdade, a economia se recupera quando ela voltar ao nível de PIB que teria caso a crise não tivesse acontecido”, disse Oreiro.

Nas contas do professor, como publicado em seu blog na internet no início de fevereiro, a tendência de longo prazo do crescimento econômico no Brasil é uma alta de 2,81% ao ano, conforme a média de 1980 a 2014. O comportamento esperado de economias em saída de recessão seria crescer acima da tendência de longo prazo, por um determinado período, para manter o crescimento na média de longo prazo.

Segundo Oreiro, foi isso que aconteceu em outras grandes recessões brasileiras, como no início dos anos 1980 e na virada dos anos 1980 para a década de 1990. Agora, porém, a retomada da economia tem sido muito mais lenta. Passados três anos inteiros (2017, 2018 e 2019) após a recessão, o nível do PIB não voltou sequer ao que era antes da crise.

E, pior, como não cresceu acima da média, no fim de 2018 o nível do PIB brasileiro estava “quase 20%” abaixo do patamar que deveria atingir caso não tivesse entrado em retração, nas contas do professor da UnB. Isso significa que o PIB deveria ser R$ 1,72 trilhão maior no encerramento de 2018, segundo escreveu Oreiro em seu blog.

Se a economia tivesse crescido, em média, 4% ao ano a partir de 2017, o PIB só retornaria ao nível da tendência de longo-prazo em 2033. Mesmo com uma média de avanço de 5% ao ano, a recuperação só ocorreria em 2026.

Para o professor, dada a magnitude da recessão de 2014 a 2016, não seria possível recuperar a tendência de longo prazo em apenas dois anos, mas a lentidão do crescimento de 2017 em diante sugere que a crise deixou marcas na própria tendência de crescimento de longo prazo. Ou seja, a crise reduziu o “crescimento potencial” do PIB, como os economistas chamam o ritmo no qual a economia consegue avançar sem provocar desequilíbrios, como inflação elevada.

“A tendência de crescimento de longo prazo da economia brasileira caiu depois da crise”, disse Oreiro, que, por isso, ressaltou no título do post em seu blog que a economia brasileira “talvez nunca se recupere” da crise.

Na interpretação do professor da UnB, há três movimentos por trás desse fenômeno. O primeiro foi a “continuidade” do processo de desindustrialização da economia brasileira, que se acentuou entre 2011 e 2012, quando o dólar baixo reduziu a competitividade internacional da indústria nacional.

O segundo movimento foi a queda “muito forte” dos investimentos na recessão. Além da crise em si, que leva empresários a adiarem projetos de expansão diante da falta de demanda, a queda foi turbinada pelo ajuste fiscal – com as contas públicas no vermelho, governos das três esferas cortaram, principalmente, os aportes em obras de infraestrutura, o que reduz a produtividade do setor privado.

Por fim, o terceiro movimento citado por Oreiro ocorreu no mercado de trabalho, após tantos anos de desemprego elevado. Quando o trabalhador fica por muito tempo desempregado, ele “perde” qualificação, ou seja, não se atualiza para continuar exercendo suas funções, que tendem a se modernizar na esteira da inovação tecnológica.

A falta de mão de obra qualificada reduz a produtividade e a capacidade de crescimento, já que atrapalha a expansão das empresas, como relatou ao ‘Estado’ a Amazon, gigante americana do comércio eletrônico que vem ampliando investimentos na filial brasileira desde o ano passado.